BEBÊS REBORN: A ESTÉTICA DA APOSTASIA MODERNA

Petrus Van Mastricht certa vez escreveu que Deus criou o homem à sua imagem e semelhança porque só é possível uma verdadeira amizade entre os seus semelhantes — e Deus queria ser amigo do homem. Nesse princípio relacional, afetivo e, sobretudo, pactual, está o fundamento da antropologia cristã reformada e da dignidade do ser humano. O homem, enquanto imago Dei, é chamado a viver responsavelmente diante de Deus, integrando suas faculdades racionais, afetivas e volitivas numa obediência ativa ao Criador. Porém, o espírito do nosso tempo opera em franca revolta contra essa verdade. E uma das expressões mais patéticas — no sentido clássico de “passiva, deformada e desordenada” — dessa apostasia é o surgimento e crescimento do fenômeno das chamadas “mães de bebês reborn”.

Não se trata aqui de mera curiosidade estética ou passatempo inofensivo. O fenômeno dos bebês reborn deve ser lido, como um sinal visível da desordem espiritual e antropológica do mundo moderno. Trata-se de uma idolatria emocional grosseira, onde mulheres — em sua maioria, socialmente deslocadas e emocionalmente desorientadas — projetam sobre bonecos hiper-realistas seus desejos não redimidos e criam, para si, um mundo imaginário onde podem ser “mães” sem os encargos, dores e responsabilidades da maternidade real. Criam um ídolo à sua própria imagem, um substituto artificial da dádiva divina da geração de filhos. É uma maternidade sem a dor do parto, sem a responsabilidade de se dedicar ao outro, sem discipulado — uma caricatura profana da maternidade bíblica.

A dimensão metafísica do erro

A metafísica cristã, fiel às Escrituras, afirma que a realidade criada é boa, ordenada, e carrega em si finalidades divinas. A geração de filhos está incluída nessa ordem, pois “Deus os abençoou e lhes disse: Frutificai e multiplicai-vos” (Gn 1.28). Em contraposição, os bebês reborn são objetos inanimados travestidos de realidade, e o ato de atribuir-lhes afeto, cuidado e maternidade é uma negação ontológica da ordem criada. Neles, a aparência usurpa a essência. O ser é negado pela imagem. A idolatria moderna não é mais de esculturas pagãs, mas de simulações hiperrealistas que zombam da vida real como tal.

Esse fenômeno é tributário de uma metafísica nominalista, herdeira da revolução moderna, que nega a existência de formas e naturezas fixas. Se um bebê pode ser “sentido” como real, ainda que não o seja, então o sentimento prevalece sobre o ser. Essa inversão é metafisicamente absurda, pois coloca o desejo humano como fundamento da realidade — e não mais a Palavra de Deus. O nominalismo, ao divorciar essência e aparência, permitiu que o mundo moderno construísse realidades fictícias com pretensões normativas, em que qualquer desejo subjetivo é entronizado como verdade última. Os bebês reborn são sacramentos de uma ontologia falsificada, e como tais devem ser denunciados.

A dimensão psicológica do erro

O coração humano, manchado pelo pecado original, tende a fugir das responsabilidades que o pacto com Deus impõe. A maternidade bíblica é antes de tudo um ato de fé: entregar a Deus o fruto do ventre, batizar os filhos como sinal de seu pertencimento ao povo da aliança, e educá-los na disciplina e admoestação do Senhor. O mundo moderno, inimigo da fé e escravo da autonomia, oferece substitutos caricaturais a essa responsabilidade.

A mulher que “adota” um bebê reborn não está apenas brincando de boneca — ela está criando um refúgio psicológico contra o chamado de Deus. Trata-se de uma regressão emocional e espiritual à infância, mas travestida de adultidade. É o retorno neurótico a um ventre que nunca gera, uma matriz estéreo que deseja nutrir sem nunca dar à luz. Do ponto de vista clínico, poder-se-ia falar de distúrbios do afeto e projeções compensatórias. Mas do ponto de vista da teologia reformada, trata-se de um pecado: é a rejeição do mandamento criacional da fecundidade e da responsabilidade parental.

A dimensão epistemológica do erro

A epistemologia reformada, fundamentada na revelação especial e iluminada pela graça regeneradora, ensina que o homem só conhece corretamente a si mesmo, o mundo e a Deus quando submete sua mente à Palavra. O conhecimento, portanto, não é autônomo, mas teonômico. Quando os afetos deformam a razão, e o desejo toma o lugar da verdade, a mente se entrega à loucura (Rm 1.21–22). A estética dos bebês reborn revela uma epistemologia sensível, centrada nos afetos caídos, em que a imagem toma o lugar da verdade e a simulação usurpa o lugar do real. Não há, neste fenômeno, nenhum compromisso com a verdade objetiva; apenas a autoindulgência de uma alma alienada de Deus e determinada a satisfazer seus impulsos idólatras.

Essa epistemologia corrompida é resultado direto da rejeição da cosmovisão cristã da criação. Só esta cosmovisão oferece um fundamento estável e verdadeiro para compreender a realidade: uma antropologia enraizada na criação, uma soteriologia centrada na graça, e uma teleologia que glorifica a Deus como fim último de todas as coisas. Fora disso, tudo é confusão, delírio e idolatria.

A fé reformada como único antídoto

A fé reformada é a única tradição teológica que, ao recuperar a estrutura criacional da realidade e o caráter pactual da vida, pode denunciar com autoridade espiritual e intelectual esse fenômeno grotesco e pós-moderno. Somente uma antropologia da aliança — que entende o homem como servo de Deus e a maternidade como vocação sagrada — pode desfazer os delírios psíquicos de um mundo que brinca de ser Deus enquanto destrói a si mesmo.

Os bebês reborn são o testemunho silencioso de uma cultura que perdeu o temor de Deus e passou a venerar suas próprias afeições desordenadas. Eles não são apenas bonecos — são ídolos. E como todos os ídolos, exigem sacrifícios: o da verdade, da razão, da responsabilidade, e, por fim, da alma.

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